A Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI), instaurada pela Câmara Municipal, avança na apuração de possíveis irregularidades cometidas durante a gestão 2021-2024 da Prefeitura de Francisco Beltrão.
A investigação foca em cerca de R$ 15,2 milhões em despesas públicas que foram executadas sem os devidos compromissos orçamentários legais, como empenho prévio ou registro em “restos a pagar”. A prática infringe diretamente as regras da Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) e levanta suspeitas sobre negligência, má gestão ou conduta dolosa por parte de ex-gestores.
A sétima audiência da CPI, realizada no dia 29 de maio, ouviu depoimentos de atuais e ex-integrantes do alto escalão da administração municipal, incluindo secretários das pastas da Saúde, Administração, Fazenda, Infraestrutura e o ex-prefeito Cléber Fontana. Os relatos revelaram deficiências nos processos de controle interno, falhas na transição entre governos e até mesmo a execução de obras públicas sem contrato ou autorização formal.
O que está sendo investigado?
A CPI foi motivada pela identificação de um passivo financeiro oculto, que não apareceu nas prestações de contas da antiga gestão, mas foi descoberto pela nova administração logo nos primeiros dias de 2025. A maior parte do montante está ligada às secretarias de Saúde e Obras Públicas. Entre os casos analisados, estão serviços iniciados antes da formalização de contratos, despesas registradas com valores simbólicos (como empenhos de apenas R$ 100), e ações realizadas sem respaldo legal.
A prática de executar gastos sem o empenho prévio é vedada pela legislação. A LRF, por exemplo, proíbe que prefeitos contratem despesas nos últimos oito meses de mandato sem garantir o pagamento integral até o final da gestão, justamente para evitar que governos deixem dívidas para seus sucessores. A CPI agora busca determinar se houve descumprimento deliberado dessa norma.
O que já foi apurado?
Durante a audiência, a atual secretária de Saúde, Cíntia Jaqueline Ramos, confirmou a existência de dívidas ocultas e contratos irregulares, indicando que a nova gestão precisou reestruturar os processos de pagamento e contratação. Já o ex-secretário da pasta, Manuel Brezolim, disse desconhecer qualquer prática fora da legalidade.
O secretário de Infraestrutura, Sérgio Galvão Júnior, reconheceu que houve obras iniciadas sem os trâmites legais completos. Um dos exemplos citados foi a substituição de pavimentação em uma praça pública, cuja execução começou antes da assinatura contratual — prática que fere normas administrativas e orçamentárias.
O ex-prefeito Cléber Fontana negou ter conhecimento prévio das dívidas irregulares e afirmou que as despesas foram delegadas com limites e orientações legais às secretarias. Fontana também destacou a complexidade da gestão pública e os desafios fiscais enfrentados pela prefeitura, embora tenha reconhecido que a responsabilidade última pelas contas era sua.
O que ainda falta esclarecer?
A CPI agora precisa aprofundar as investigações para determinar quem autorizou a execução das despesas sem cobertura orçamentária, e se houve dolo ou apenas falhas operacionais e administrativas. Também será necessário verificar se houve omissão intencional na transição de governo e quais medidas podem ser adotadas para evitar a repetição dessas falhas.
A comissão ainda avaliará se os responsáveis devem responder judicialmente por improbidade administrativa, crime de responsabilidade ou outras infrações legais. Além disso, o relatório final poderá recomendar ações corretivas na estrutura de fiscalização e controle interno da prefeitura.
O que está em jogo
O caso levanta um alerta importante sobre a fragilidade dos mecanismos de governança fiscal no setor público, especialmente em períodos de transição de governo. Além do prejuízo aos cofres públicos, as irregularidades comprometem a transparência e a confiança da população nas instituições.
A CPI atua com o objetivo de resguardar o interesse público, assegurar o cumprimento da legislação e responsabilizar eventuais envolvidos, contribuindo para um ambiente administrativo mais ético e eficiente em Francisco Beltrão.
A próxima audiência deve ouvir novos depoimentos e aprofundar a análise técnica dos contratos e empenhos relacionados ao período investigado.