domingo, junho 30, 2019

Bazuca retirada das ruas de Curitiba é atração em museu pouco conhecido


DELEGADO da Delegacia de  Explosivos, Armas e Munições (Deam),  DR Adriano Chohfi.

      De lançador de foguetes às armas caseiras. Esse é o pequeno acervo que pode ser visto em um museu improvisado na Delegacia de Explosivos, Armas e Munições (Deam), em Curitiba. A coleção é pequena, mas impressiona pela criatividade e pelas relíquias que se apresentam no acervo. Revólveres da Segunda Guerra, minipistolas, metralhadoras caseiras e peças históricas como a submetralhadora usada pelos irmãos Oliveira – quadrilheiros famosos nos anos 80 – podem ser vistas. Em sua maioria, as armas são resultado de apreensões policiais e de devoluções da época do desarmamento, que entrou em vigor em 1999.

A delegacia, a visitação pública é gratuita, porém restrita. Depende de agendamentos e disponibilidade da equipe da Deam para atendimento ao público.

Na sala do delegado da Deam, Adriano Chohfi, que o lançador de foguetes fica guardado. Ele assumiu o cargo há pouco mais de cinco meses, mas já tem uma ligação forte com a delegacia. “É um ambiente carregado de história. Algumas não tão simples de lembrar, como a do funcionamento do DOPS (Departamento de Ordem Política e Social), na época da ditadura militar. Outras interessantes, como as de algumas apreensões das armas que estão aqui”, diz Chohfi. O delegado contou que o lança foguetes estava com um garupa de uma moto. “Piloto e garupa andavam tranquilamente pela rua. O garupa levava a arma pendurada nas costas, quando a polícia fez a abordagem. Isso aconteceu há sete ou oito anos”.

O investigador Emílio Cezar Bezerra é quem resgata as histórias. Profundo conhecedor de armas, na ‘cristaleira‘ do museu ele apresentou uma submetralhadora 9 mm, que pertenceu aos Irmãos Oliveira. “Eles eram os precursores do crime organizado de hoje. Eram o terror do oeste do Paraná. Faziam assaltos, muitos deles em propriedades rurais. Invadiam e levavam tudo o que podiam”, contou. O carregador da arma é para 20 tiros. Ela tem, inclusive, tripé para apoio em qualquer base sólida, o que facilita a mira. “Ela acabou no museu porque, na época, final da década de 1980 e início de 1990, tudo que o que era apreendido de armas ia parar na Deam. Hoje o Deam não fica mais com armas deste tipo”, disse Bezerra.

Dá para conhecer no museu um revólver caseiro que mais se parece com aquelas armas Nerfs infantis, só com o tambor na parte da frente. Bezerra diz ser um revólver calibre 36. “Inclusive a Taurus fabrica um carregador nesse mesmo estilo, mas ele fica no meio do revólver, normal. Não é assim, na frente”. No caso da arma do museu, ela funciona mesmo como uma Nerf, com cartuchos – e não balas normais – inseridos no tambor. “O suficiente para fazer assaltos e por aí afora. Afinal, armas caseiras não são feitas para boa coisa. Há, no mínimo, um objetivo de uso. Até para uma intimidação”, comenta o investigador.

Outra arma é a cara de uma ferramenta para encanamento. Parece uma chave inglesa incrementada. É um tipo revólver extremamente rústico, que funciona puxando uma alavanca na parte traseira, presa por uma mola. “Era um tiro por vez, mas servia plenamente para o uso”, brinca Emilio.

Algumas histórias das armas expostas se perdem no tempo e no espaço. Umas podem ter vivido situações de crime, outras apenas foram entregues por cidadãos que não queriam mais tê-las. “Têm armas nacionais do Brasil pós-guerra, como a INA 45, que ficou muito famosa na polícia. Também outras raridades. Além disso, há documentos antigos de posse e porte de armas que eram emitidos aqui”, pontua Emilio Bezerra. As armas são expostas dentro de uma sala e há algumas pregadas nas paredes dos corredores.

Antigo DOPS

Atualmente, a Deam administra somente as armas dos policiais ou de funcionários públicos. As armas mais modernas, que não ficam no museu, ou as que são apreendidas em ocorrências policiais, acabam indo para a perícia, a chamada Polícia Científica. Se forem armas de policiais, vão para a perícia e depois retornam para a delegacia de origem. Os investigadores contam que, antes das discussões sobre o desarmamento, tudo que era relacionado às armas era a Polícia Civil que fazia.

Quando houve a anistia, que não se perguntava nada para quem quisesse entregar a arma, era na Deam que se fazia isso. Discussões, leis, decretos e plebiscitos sobre o Estatuto do Desarmamento em vigor no Brasil ocorreram entre os anos de 2003 e 2005. Em 2019, novas discussões sobre o tema tramitam no Congresso e no Senado.

A Deam manteve na coleção algumas dessas armas entregues de boa-fé pelos cidadãos, durante a anistia. Essa decisão foi tomada por causa do valor histórico de algumas delas e até mesmo didático. As demais foram encaminhadas para a destruição, no Exército – instituição responsável por cumprir tal medida. Caso isso não ocorresse, essas armas ficariam registradas como acervo da delegacia, impedindo que se adquirissem armas novas para os policiais em atividade.

Além de abrigar o museu e ser responsável pelas armas da polícia, a Deam tem poder de fiscalização e emite taxas e tributos que são cobrados nas atividades que possam apresentar algum perigo. Passam por ali os pedidos de transporte de produtos controlados, circulação de carros blindados, armas e munições da polícia civil. Na área dos explosivos e artefatos pirotécnicos, a Deam atua junto com o Exército na fiscalização – e também Corpo de Bombeiros, para atividades como festas que utilizam esses artefatos.

 “A delegacia de Curitiba é responsável pelo estado inteiro. No interior, atuamos com o apoio das subdivisões da Polícia Civil”, explica o delegado Adriano Chohfi.

Prédio histórico

    O DOPS já ocupou o local onde fica a Deam. O endereço é a Rua Desembargador Ermelino de Leão, 513, no São Francisco. O prédio é cheio de túneis e salas sem janelas. Hoje, as salas servem como depósito de materiais, incluindo documentos, livros de registros – nos quais os cativos eram chamados de ‘hóspedes‘ – e até caixas com simulacros de armas (feitas de plástico).

Para quebrar o peso da história, na antessala de entrada para os antigos corredores do DOPS, o grafiteiro Bolacha Graffiti, de Curitiba, desenhou na parede uma tropa de elite da Polícia Civil em ação.

Quando o visitante olha para o grafite em 3D, a metralhadora do primeiro policial do grupo aponta direto para os olhos dele, não importa o lugar em que se esteja na sala. A sensação é de vigilância total, simbolizando a atuação da polícia no dia a dia.

No local também funcionam outras unidades. A Delegacia de Crimes Contra a Economia e Proteção ao Consumidor (Delcon), Delegacia de Repressão aos Crimes Contra a Saúde (Decrisa), Delegacia de Proteção à Pessoa Desaparecida (DPP).

Por Alex Silveira